ópera & musical
Navio negreiro (1840)
Turner
91x123cm
Museu de Belas Artes de Boston
Boston, E.U.A.
domingo, 25 de agosto de 2019
Triunfo da Beleza em Orpheu e Eurídice
Poucas são as óperas encenadas por aqui. Mas essa realidade vai mudando no Rio Grande do Sul. A OSPA tem sido responsável por tal mudança. Depois do sucesso de A Viúva Alegre, em 2018, chegou aos palcos Orpheu e Eurídice (de C.Gluck), apresentada no último sábado (24), no Theatro São Pedro, em Porto Alegre.
Considerada a "Ópera da Reforma", já que Gluck (1714-1787) realizou diversas modificações na ação operística, em Orpheu e Eurídice há o uso imaginativo da orquestra (explorando os potenciais dos instrumentos como complementos psicológicos), a nova dimensão do papel do balé, e o uso do coro como se fazia nas tragédias gregas. Nesse sentido, cabe o destaque para as participações especiais do Coro Sinfônico da OSPA e da Cia Municipal de Dança de Porto Alegre. A partitura coreográfica poderia ser um pouco mais elaborada. No entanto, o palco do TSP não o comportaria, tendo em vista o cenário muito bem pensado e executado, que contribuiu para a narrativa. Neste quesito, destaque para elementos suspensos, que lembraram prisão e terror quando Orpheu, resgatando Eurídice do Hades, percorre o caminho de volta com a amada sem poder olhá-la (condição imposta por Eros), e esta, diante disso, fica em dúvida sobre o amor daquele, gerando um enclausuramento perante a situação de horror e angústia. Mesmo destaque: para elementos cênicos (piano, outros instrumentos musicais e partituras) que eram manipulados pelos bailarinos e pelo coro - especialmente quando interpretaram as Fúrias e Sombras; para a iluminação (que alternou sensações de alegria e dor); e para o figurino (lembrando excessos e exageros na dor, e fluidez, leveza e eteridade na alegria). Excelente composição cênica e cenográfica.
Ótima performance das solistas, da orquestra, do coro, dos bailarinos, dos músicos (destaque para o cravo, sempre bem tocado, quando em apresentação), especialmente no final do terceiro e último ato, quando Orpheu, Eurídice e Eros em perfeita harmonia e amor, juntamente com grande grupo de pastores, celebram o retorno da amada. Aí há o triunfo da Beleza, encarna da na música (tema central neste mito grego), a grande personagem da ópera.
O público vibrou, comprovando que a realidade crua que vivenciamos carece exatamente neste ponto.
GUILHERME REOLON DE OLIVEIRA
MTb 15.241
segunda-feira, 1 de outubro de 2018
Nanetto Pipetta e Os Miseráveis: duas facetas da arte caxiense
Apresentaram-se em Caxias neste mês de setembro dois espetáculos teatrais bem distintos que, porém, refletem uma certa multiplicidade cultural representativa da cidade, ainda que restrita. Foram eles: Mitincanto, do grupo Miseri Coloni, apresentado no dia 08, no Teatro Pedro Parenti; e Os Miseráveis, apresentado no dia 25, no Teatro do Campus 8 da UCS.
Mitincanto – aventuras e desventuras de Nanetto Pipetta foi uma opereta no sentido tradicional: um gênero da ópera, de duração mais curta e com apelo cômico. O grupo o classificou como “espetáculo envolvendo música, canto e teatro” – exatamente uma opereta na nossa concepção. Uma opereta sobre as mazelas e alegrias da saga de imigração italiana, seus mitos tradicionais e mais uma dose de comicidade quase à la Chaplin. O grupo já havia encenado a história de Nanetto Pipetta, vivida pelo inesquecível ator que dá nome ao teatro da Casa da Cultura, daí também a dificuldade em interpretar o texto, já que o Nanetto de Pedro Parenti ainda está vívido na memória do público. Mitincanto, baseado em roteiro escrito por José Clemente Pozenato, foi uma excelente homenagem àquele. Falada em talian e português, a peça narra a epopeia do personagem: o nascimento na Itália, a imigração ao Brasil, o casamento, as dificuldades alegorizadas pelos mitos de Sanguanel, dentre outros da tradição veneta.
Os Miseráveis, em outra ponta, foi uma adaptação da obra homônima de Victor Hugo, já encenada nos palcos e levada ao cinema por Hollywood. Não muito diferente, a obra também narra as mazelas de um personagem e seus congêneres numa França alegorizada que remete à Revolução de 1789: os revolucionários, antes em dificuldades extremas, sendo perseguidos, vendidos, mal-tratados. Embora a adaptação tenha sido fruto de um trabalho acadêmico, nada perdeu em relação a uma apresentação considerada profissional. Se houveram equívocos, foram nos quesitos iluminação (com alguns focos descentrados) e, principalmente, de sonorização – o que é grave para um musical – : os instrumentos estavam com o som muito alto, ao passo que as vozes dos atores/cantores quase não eram ouvidas e compreendidas. Com isso, perdia-se importantes partes do roteiro. Vale destacar que o espetáculo foi reunião de alunos de diferentes cursos: música, artes visuais, arquitetura, design, design de moda, estética e cosmética, iluminação, cenografia. Ou seja, não há curso de artes cênicas na UCS, o que torna a apresentação ainda melhor avaliada: os atores estavam muito bem em cena.
Guilherme Reolon de Oliveira
Mtb 15.241
sexta-feira, 31 de agosto de 2018
O QUATRILHO, A VIÚVA ALEGRE E BEATLES: Um convite às Artes
Três foram as programações que nos marcaram nos últimos dias, por isso denominadas no título de “ Convite às Artes”. Todas, embora de formas singulares, lembraram o que Wagner pensara como arte total, porque integradoras de linguagens e formas artísticas.
A primeira delas, O Quatrilho, foi uma ópera baseada no romance homônimo, também adaptado para o cinema e concorrente ao Oscar de melhor filme estrangeiro. O Quatrilho trouxe a essência do romance, no sentido de ter reduzido este a suas cenas mais marcantes, cenas de transformação da narrativa, quebras e rupturas. O figurino estava condizente com o contexto discursivo e o cenário teve destaque, seja por sua concisão (poucos, porém icônicos elementos - como a roda d’água do moinho, a mesa da cozinha, a cama do quarto, o banco público), seja por sua magnitude (de dimensões e de semiótica). Em dois atos, O Quatrilho foi cantado em italiano – uma tradição na ópera, e língua da narrativa mesma – com diálogos intercalados em talian (hoje também l íngua oficial). A qualidade cênica dos atores teve destaque, qualidade ainda maior no que tange ao canto lírico.
Tal destaque também pôde ser conferido em A Viúva Alegre, dado que alguns atores/cantores estavam em ambas as apresentações. A Víúva Alegre foi uma opereta, um tipo de ópera, de teor mais cômico, cantada em português, intercalada também por diálogos não cantados, executada em três atos. Cabe destacar que, embora extensa (três horas de duração com os intervalos), a execução foi de uma dinamicidade ímpar, que deixou o público muito a vontade e deu aquela sensação de “nem vi o tempo passar”. Os figurinos e os cenários foram excepcionais: criativos e agregadores de sentido e presença, tornaram o espetáculo ainda mais singular. Outro destaque foi a atualização do texto, de Franz Lehár (encenado pela primeira vez em 1905), para a realidade brasileira (no viés político) e gaúcha (com o uso de expressões características).
Tanto O Quatrilho quanto A Viúva Alegre nos lembraram da arte total (preconizada por Wagner), pois ambas congregaram de maneira muito singular música (a primeira executada pela Camerata OntoArte; a segunda, pela OSPA), canto, artes cênicas (teatro e dança – esta última em A Viúva Alegre, com um corpo de baile muito bom) e artes visuais (na com posição do todo).
Não em menor grau, mas diferente foi a abordagem da Orquestra Ouro Preto que, embora não tenha a intenção de ser teatral, teve certos momentos cênicos (com alguns músicos quase a dançar tocando). A Ouro Preto trouxe ao público clássicos dos Beatles em excelente execução.
Guilherme Reolon de Oliveira – MTb 15.241
Vera Marta Reolon – MTb 16.069
Domingo, 25 de agosto de 2019
Ousadia e Presença em The Book of Broadway
É evidente o destaque de The Book of Broadway, musical apresentado no último domingo (18), no Teatro Murialdo, em Caxias: a ousadia, não só do elenco, mas da produção, em armar um pout pourri dos diferentes musicais que marcaram a Broadway. Foram apresentados trechos de Rei Leão, Mary Poppins, O Fantasma da Ópera, A Bela e a Fera,..., mas o que surpreende é a presença de Gustavo Essbich, o showman a frente do espetáculo, sempre em cena, sempre com a mesma adrenalina, óbvio que um pouco nervoso, o que afetou, especialmente nas primeiras músicas, sua performance vocal. Carisma e leveza de movimentos nos números de dança, no entanto, supriram quaisquer equívocos.
No que se refere ao canto, maior excelência foi do Quinteto Macedo, que segurou o espetáculo nos pequenos deslizes dos demais intérpretes. No que se refere à dança, todavia, Essbich se destaca mais que o grupo da Escola de Dança Carla Barcelos - é mais desenvolto, menos mecânico, embora, o destaque de algumas bailarinas em detrimento de outras. Óbvio que o espetáculo não aconteceria sem o corpo de baile.
Realce também para o figurino, sem excessos. Quanto ao cenário, porém, faltou pouco mais de atenção, já que incipiente, se pensarmos na iluminação como fonte de supressão daquele. Esta, no entanto, em alguns momentos, pareceu excessiva, ou pouco harmônica ao contexto do número apresentado.
Por fim, cabe lembrar mais uma vez da ousadia e da presença: produzir um musical não é fácil, ainda mais em uma realidade, como a caxiense, que não só não valoriza arte, como a vê como supérflua e desnecessária. Segurar um espetáculo desse tipo, em dois atos, não se pode negar: é para poucos! E poucos são os que se atrevem a isso!.
GUILHERME REOLON DE OLIVEIRA
MTb 15. 241
quarta-feira, 7 de agosto de 2019
Audácia em executar musical é ponto alto do Animato
Do cinema para o teatro, de Hollywood aos palcos de Caxias. O espetáculo "A Família Adams - O Musical", apresentado sábado (03), no Teatro Pedro Parenti, parece até mesmo ter dado continuidade aos filmes que podem ser considerados já clássicos dos anos 1990.
O Grupo Animato, responsável pelo espetáculo, foi audacioso e transformou em musical a família emblemática. No que tange à performance dos atores, destaca-se o desempenho nas coreografias, bem elaboradas e bem executadas. Quanto à atuação, o destaque é para a expressividade. Melhorias, obviamente, podem ser realizadas, especificamente na preparação vocal. Há potencial, parece que pouco mais de segurança resolveria algumas questões.
Destaque também para o roteiro do espetáculo, especialmente numa época carente de roteiros bem estruturados, com narrativa - observa-se, hoje, mais performance e menos teatro. Ainda mais por constituir-se musical, raro por aqui (e por todo lugar). Cenário simples, mas eficaz em seu objetivo: marcar signos que remetem narrativa. Iluminação bem executada. Para dar mais fluidez, a direção poderia pensar em alternativas no entre-cenas, que ficaram sempre no escuro.
GUILHERME REOLON DE OLIVEIRA
MTb 15.241
terça-feira, 24 de outubro de 2017
O Fantasma da Ópera Revisitado
Muito boa a apresentação de O Fantasma da Ópera, encenado e produzido pelos acadêmicos de Artes Visuais, Arquitetura, Design, Design de Interiores, Design de Moda e Música da UCS. O espetáculo, apresentado no UCS Teatro, no último domingo, mostrou-se um importante acontecimento, dada a integração dos cursos e o resultado, muito próximo a encenações profissionais, por vezes superando muitas delas.
Correções no quesito interpretação cênica- importante ressaltar que não no quesito musical – poderiam ocorrer, mas cabe lembrar também que a UCS não possui curso de teatro. Nesse sentido, o espetáculo mostrou coesão e integridade na execução, com boa interpretação vocal e instrumental. Quanto às canções, foram mantidas suas versões originais, ainda que algumas já tenham versões em português: em se tratando de ópera, poder-se-ia ter optado pela tradução. A opção pelo original também é válida (cabe ressaltar que a produção teve o cuidado de confeccionar “libreto”, o que auxilia o leigo na apreciação da obra). O figurino também deve ser destacado, o qual propôs uma releitura do musical clássico de Andrew Lloyd Webber, atualizando-o para uma versão dark, próxima ao que se convencionou chamar – já não mais dessa forma – de estética emo. Isso ficou coerente com o roteiro de Fantasma. O mesmo aconteceu com o cenário que, entretanto, poderia ter sido melhor explorado, com a inclusão de mais elementos cênicos. Uma sugestão para uma próxima montagem é a parceria com acadêmicos do curso de Dança, que se integrariam perfeitamente aos demais, dando mais dinâmica ao espetáculo.
Embora a direção tenha ressaltado que o trabalho fosse amador, O Fantasma da Ópera apresentado teve produção e execução muito superior a de espetáculos profissionais, inclusive apresentados na capital por integrantes de redes de mídia dominante, em festivais como Porto Verão Alegre, Porto Alegre em Cena e Palco Giratório, fortemente criticados por nós, ainda que lotados (exatamente pela divulgação dos grandes veículos de comunicação, cujos atores –encenadores, são funcionários).
A Universidade é um centro de saber interdisciplinar. Só quando acontece assim, não fragmentada, é que atinge seu objetivo. E trabalhos como o avaliado atestam isso.
Guilherme Reolon de Oliveira
MTb 15.241